2 de fev. de 2016

Muito prazer, eu sou Isaque.

Era madrugada, todos ainda dormiam. Meu pai com um beijo carinhoso despertou-me e disse: “Isaque! Acorda! Vamos sacrificar ao senhor.” Estiquei as pernas, os braços e como desejei ficar mais algumas horas deitado. Meu corpo ainda doia das atividades do dia anterior, mas levantei.
Caminhamos diversas horas e uma coisa me incomodava. Meu pai adorava falar, contar histórias, aconselhar e sempre mostrava-me as maravilhas que Deus tinha feito em nossa família. O velho sempre contava sobre a promessa divina de que nós seríamos uma grande nação. Naquele dia ele não dizia uma só palavra. Às vezes balançava a cabeça como se algo estivesse errado. Fiz várias tentativas de diálogo, mas meu pai pareceia entorpecido. Na primeira vez, indaguei onde iríamos sacrificar a Deus. A resposta rápida foi: “Deus mostrará”. Em seguida perguntei se faltava muito pois minhas alparcas estavam queimando! Outra resposta rápida: “Deus é quem sabe”. Eu sabia que algo não estava certo. Decidi então abraçar meu velho e seguimos calados toda a viagem. Depois de muito caminharmos, fitei meus olhos no rosto de meu pai e percebi uma lágrima escorrendo. Ia perguntar o que era, mas resolvi apenas apertá-lo mais forte e continuar caminhando. Sentia que seu coração estava muito incomodado.
Não levamos nenhum cordeiro, achei estranho, mas logo concluí que compraríamos um perto do local do sacrifício. Quanto mais caminhávamos, maior era a angústia do meu velho. O que ele estaria pensando? Dei uma parada e disse: “Pai está tudo bem?” Ele olhou bem dentro dos meus olhos e com um olhar desolado me disse: “Ficará meu filho. Ficará tudo bem.” Eu nunca tinha visto meu pai assim…
Caminhamos por mais algum tempo, aquele silêncio angustiava meu coração. Foi quando chorei. Não sabia porque, mas eu chorei. Meu pai me abraçou forte, apontou o monte e disse: “É aqui.” Nós choramos. O pai chorava sabendo o que aconteceria, já eu chorava a angústia de meu pai. Meu coração acelerou. Pegamos a lenha, o velho ordenou que nossos servos aguardassem ali pois seríamos só ele e eu no monte do sacrifício.
Bem perto do local designado, fiz a pergunta que esclareceu tudo para mim. “Eis aqui a lenha, mas onde está o cordeiro para o sacrifício?” Entre lágrimas, com seu rosto marcado pelo sol e pelos anos, o velho Abraão responde: “Deus proverá.” Naquele momento entendi que eu era o sacrifício. Meu coração disparou ainda mais e pensei em correr. Ao mesmo tempo uma sensação de paz foi tomando meu ser e ouvi uma voz interior dizendo que eu não deveria temer pois o Deus do meu pai estava comigo e eu fazia parte da promessa. Arrumamos a lenha sobre o altar e sem que meu pai pedisse, estiquei meus braços. Não trocamos nenhuma palavra. Já com a corda enrolada recebi um abraço. O pai chorou, o filho chorou. Ele me acompanhou até o altar e ali eu deitei. É estranho, mas meu coração continuava em paz.



Meu pai estava prestes a sacrificar o filho que ele amava. Eu não tinha dúvidas disso, pois sentia seu amor para comigo em cada uma das suas atitudes. Quanto a mim, estava pronto para ser um instrumento nas mãos de meu pai para atender um pedido de Deus, ainda que tudo parecesse loucura, um pai entregar o seu próprio filho em sacrifício. Naquele momento pude perceber, de verdade, o que Deus representava para o meu pai. Fechei os olhos e pedi a Deus: “Se possível, não deixa isso acontecer comigo. Mas que acima de tudo, tua vontade prevaleça.” Mal terminei minha oração e meu pai estava desamarrando-me, rindo e chorando compulsivamente. Mostrava-me o cordeiro para o sacrifício preso nos arbustos. Sorriu o pai, sorriu o filho.


“Porque Deus amou o mundo de tal maneira, que deu o seu filho unigênito para nos salvar.”
Texto do Alexandre Oliveira

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